Desenvolvimento Econômico, Humano e Social e a EPT

          A ideia de transformação inerente ao vocábulo desenvolvimento remete a conceitos como crescimento e progresso; trata-se da evolução de um estado prévio para uma nova realidade, um estado novo caracterizado por ser tanto qualitativamente como quantitativamente, superior ao anterior. Nesse sentido, tal termo se faz presente em diversas áreas do conhecimento humano (BARACHO; FAUVRELLE, 2014).

          Schumpeter (1997) ensina que o desenvolvimento econômico implica mudanças estruturais do sistema econômico em vez de ser considerado o simples crescimento da renda per capita. Um país pode observar crescimento dos níveis de renda e não gerar desenvolvimento econômico. É necessário que haja transformações nas dimensões econômicas, social, política e ambiental. Desse modo o aspecto fundamental, para Schumpeter, a respeito do desenvolvimento econômico é o processo inovativo aplicado ao sistema produtivo das organizações. A inovação exerce portanto um papel central no dinamismo econômico, uma vez que promove, entre outros fatores, o aumento de produtividade das empresas e, por conseguinte, de toda a economia. Em outras palavras, fazer investimentos sistemáticos em pesquisa e desenvolvimento e na produção de novas coisas pode ser capaz de dinamizar o crescimento econômico e produtivo, gerando efeitos em cadeia sobre a produção, o emprego, a renda e os salários. No pensamento de Schumpeter (1997, p. 74):


Entenderemos por ‘desenvolvimento’, portanto, apenas as mudanças da vida econômica que não lhe forem impostas de fora, mas que surjam de dentro, por sua própria iniciativa. Se se concluir que não há tais mudanças emergindo na própria esfera econômica, e que o fenômeno que chamamos de desenvolvimento econômico é na prática baseado no fato de que os dados mudam e que a economia se adapta continuamente a eles, então diríamos que não há nenhum desenvolvimento econômico. Pretenderíamos com isso dizer que o desenvolvimento econômico não é um fenômeno a ser explicado economicamente, mas que a economia, em si mesma sem desenvolvimento, é arrastada pelas mudanças do mundo à sua volta, e que as causas e, portanto, a explicação do desenvolvimento devem ser procuradas fora do grupo de fatos que são descritos pela teoria econômica.


            Por sua vez o desenvolvimento econômico é explicado por Furtado (1981) como um termo associado ao desenvolvimento humano; como o processo no qual a sociedade humana busca melhor realizar as suas virtualidades e potencialidades.Baracho e Fauvrelle (2014, p.242) complementam o pensamento de Furtado ao afirmar que:


o desenvolvimento de uma sociedade está intimamente relacionado ao desenvolvimento de sua economia. O nível de produção de uma sociedade depende, basicamente, do estoque disponível de fatores (capital e trabalho), e da forma como eles são combinados, a qual é definida em razão do padrão tecnológico disponível.


            O desenvolvimento econômico pode ser visto como a evolução de uma sociedade em busca de melhores condições de realizar as suas potencialidade e virtualidades, garantindo, assim, a melhora dos seus padrões de bem-estar, conforme Bresser-Pereira (2008, p. 1):


O desenvolvimento econômico é o processo de sistemática acumulação de capital e de incorporação do progresso técnico ao trabalho e ao capital que leva ao aumento sustentado da produtividade ou da renda por habitante e, em consequência, dos salários e dos padrões de bem-estar de uma determinada sociedade.


            Oliveira (2002) aborda a relevância do debate acerca do conceito de desenvolvimento no meio acadêmico, especialmente com relação à distinção entre desenvolvimento e crescimento econômico, uma vez que muitos autores consideram que para se chegar ao desenvolvimento é suficiente a análise acercados incrementos constantes no nível de renda como condição primordial, sem, no entanto, se preocupar como tais incrementos são distribuídos. Pode-se ainda acrescentar à discussão a visão de Scatolin (1989, p.24) quando afirma que “apesar das divergências existentes entre as concepções de desenvolvimento, elas não são excludentes. Na verdade, em alguns pontos, elas se completam”.

            Pelo exposto, é perceptível que não há melhoria das condições de renda per capta, se não houver qualificação do indivíduo, trabalhando as suas fragilidades e maximizando as suas potencialidades, com a finalidade de obter ganhos em seu desenvolvimento humano.

            No ano de 1990 a Organização das Nações Unidas (ONU) editou através do Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (PNUD) seu primeiro Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH). Nele é apresentada uma sistematização da noção de desenvolvimento humano que passou a ser utilizada para avaliar o grau de melhoria, ou não, do bem-estar de todos os grupos sociais nos diversos países.  Essa sistematização deu-se através da criação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que dentre outros aspectos analisa: a ampliação e/ou a estagnação do acesso a um melhor aporte calórico na alimentação; a existência de redes de saneamentos básicos; o atendimento médico de qualidade às pessoas e o acesso universal a escola para as crianças. O RDH descreve que:


O desenvolvimento humano é um processo de ampliar as escolhas. Mas o desenvolvimento humano também é o objetivo, portanto, é um processo e um resultado. O desenvolvimento humano implica que as pessoas devem influenciar os processos que moldam suas vidas. Em tudo isso, o crescimento econômico é um meio importante para o desenvolvimento humano, mas não o fim. O desenvolvimento humano é o desenvolvimento das pessoas através da construção de capacidades humanas, pelas pessoas por meio da participação ativa nos processos que moldam suas vidas e para as pessoas, melhorando suas vidas. Isto é mais amplo do que outras abordagens, como a abordagem de recursos humano, a abordagem de necessidades básicas e a abordagem de bem-estar humano. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) composto integra três dimensões básicas do desenvolvimento humano. A expectativa de vida ao nascer reflete a capacidade de levar uma vida longa e saudável. Os anos médios de escolaridade e os anos de escolaridade esperados refletem a capacidade de adquirir conhecimento. E a renda nacional bruta per capita reflete a capacidade de alcançar um padrão de vida decente.Para medir o desenvolvimento humano de forma mais abrangente, o Relatório de Desenvolvimento Humano também apresenta quatro outros índices compostos. O IDH ajustado à desigualdade, que desconta o IDH de acordo com a extensão da desigualdade. O Índice de Desenvolvimento de Gênero que compara mulheres e homens em valores de IDH. O Índice de Desigualdade de Gênero destaca o empoderamento das mulheres. E a Pobreza Multidimensional, índice mede as dimensões não-renda da pobreza. (ONU, 2016, p.2-3, tradução do autor)

 

           O conceito de Desenvolvimento Humano foi construído, em grande parte, pelo pensamento de Amartya Sen, economista Indiano vencedor do Nobel de Economia em 1998 por suas contribuições à economia do bem-estar estabelecendo novos paradigmas para o desenvolvimento e para teoria da escolha social. Para Sen, a expansão das capacidades das pessoas, fomenta o aumento das possibilidades de escolhas como a liberdade de cada um de levar um determinado tipo de vida. Liberdade que cada pessoa tem para determinar o que quer, o que valoriza e o que decide escolher por ela mesma, pelos outros, pela comunidade onde está inserida e pelo Estado. Maior liberdade significa maior oportunidade para buscar os objetivos individuais (SEN, 2008). Nas palavras de Sen:


a perspectiva da capacidade é uma concepção da igualdade de oportunidades, que destaca a liberdade substantiva da qual as pessoas são portadoras para levar suas vidas. Essa liberdade denota o que as pessoas podem fazer ou realizar, quer dizer, a liberdade para buscar seus objetivos. As ‘oportunidades reais’ (ou substantivas) de que uma pessoa dispõe para realizar, entre outras coisas, objetivos ligados ao bem-estar são representadas por sua capacidade (SEN, 2008, p. 13).


            Para Sen (2000), o conceito de desenvolvimento é expansão das capacidades das pessoas. Assim, as políticas públicas devem, mais do que simplesmente aumentar ou igualar as oportunidades auferidas, permitir que sejam mais livres (liberdade substancial) para vivera vida escolhida por elas mesmas. Nesse contexto percebesse uma via de mão dupla, em que as capacidades das pessoas são valorizadas e aumentadas pelas políticas públicas do Estado por um lado, e por outro as políticas públicas são influenciadas pelo uso efetivo das capacidades participativas das pessoas. Dessa forma, pode-se medir o grau de desenvolvimento de uma sociedade pelas liberdades substantivas que os membros dessa sociedade detêm:


As liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas também os meios principais. Além de reconhecer, fundamentalmente, a importância avaliatória da liberdade, precisamos entender a notável relação empírica que vincula, umas às outras. Liberdades políticas (na forma de liberdade de expressão e eleições livres) ajudam a promover a segurança econômica. Oportunidades sociais [...] facilitam a participação econômica. Facilidades econômicas [...] podem ajudar a gerar a abundância individual, além de recursos públicos para os serviços sociais. Liberdades de diferentes tipos podem fortalecer umas às outras. (SEN, 2000, p. 26).


            Face o exposto é notório que o desenvolvimento humano só ocorre quando há uma interação com o meio em que o indivíduo vive, entende-se assim, que é através desta interação, que ocorre a evolução do ser humano de forma individualizada. Mas o conjunto de evoluções individualizadas compõe o tecido social de determinado local o que consequentemente potencializa o desenvolvimento social.

          O desenvolvimento social parece, na prática, elemento essencial para a existência do desenvolvimento econômico sustentado. Os investimentos em capital humano e capital social e melhoria da equidade, além de fins em si mesmos a partir da perspectiva de sociedades democráticas, são políticas necessárias para que o crescimento econômico possa ter bases firmes. É fundamental a existência crescimento econômico, estabilidade monetária, equilíbrios econômicos e financeiros, sem os quais não há base de sustentação para desenvolvimento social; em contrapartida, eles esses quesitos não serão sustentáveis a médio e longo prazo sem que se produza um desenvolvimento social ativo. (KLIKSBERG, 1998).

          Tratar o tema do desenvolvimento social requer capacidade de enfrentamento a diversas questões sociais como gênero, raça, renda,emprego, acesso universal a bens de consumo coletivo, dentre outros. Tais questões marcam nossa sociedade, de modo que o debate acerca do desenvolvimento social não pode ser restrito à dimensão única da pobreza.Tal abordagem apresenta, de imediato, várias implicações. Em primeiro lugar, exige a superação da dicotomia entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento social; em consequência, a busca de uma nova articulação entre políticas econômicas e políticas sociais que visem à efetiva redistribuição de renda, forjando-se, assim, modelo de desenvolvimento capaz de promover maior justiça social (LAMPREIA, 1995)

          As novas perspectivas de trabalho em desenvolvimento social fazem surgir a necessidade de juntaras potencialidades de todos os atores sociais que podem contribuir. Kliksberg (1998, p.67) destaca que:


O Estado deve ser o fator convocante da formação de meta-redes, que integrem, junto com os organismos públicos da área social, as regiões e os municípios, as ONGs, fundações empresariais privadas, movimentos sindicais, organizações sociais religiosas, Universidades, organizações de vizinhos, outros atores da sociedade civil e as comunidades pobres organizadas. Estas meta-redes tenderiam a apoiar-se mutuamente e a aproveitar o melhor que cada um dos atores tem para contribuir e, ao mesmo tempo, superar as fraquezas que apresentam.


De modo complementar Lampreia (1995, 17) propõe que:


Um enfoque articulador das dimensões econômicas e sociais do processo de desenvolvimento requer nova superação, desta vez de concepção e desenho de políticas sociais tendo como alvo exclusivo os despossuídos (carentes), o que significa atribuir-lhes o estatuto de meras políticas compensatórias das desigualdades sociais; ao contrário, essa nova concepção implica conceber políticas sociais, também elas, como promotoras de desenvolvimento econômico, emprego e trabalho.


          Para Kliksberg (2001), junto ao crescimento econômico, surge a necessidade de alcançar o desenvolvimento social, melhorar a equidade, fortalecer a democracia e preservar os equilíbrios do meio ambiente. Com atenção especial a temas fundamentais que excedem as abordagens convencionais como: a ênfase na promoção da educação, a preservação e aprofundamento da democracia, a justiça e os direitos humanos, a luta contra a pobreza e a discriminação, o fortalecimento dos mercados financeiros e a cooperação regional em assuntos ambientais. O autor ainda destaca que:


Melhorar o perfil da população constitui, em termos de desenvolvimento, uma via fundamental para alcançar produtividade, progresso tecnológico e competitividade nos cenários econômicos de final de século. Neles o papel do capital humano na produção é decisivo. Em estruturas produtivas, cada vez mais baseadas em conhecimento, como as presentes e prospectivas, os níveis de qualificação média de uma sociedade serão determinantes em suas possibilidades de níveis de gerar, absorver e difundir tecnologias avançadas. A educação faz uma diferença crucial, segundo as medições disponíveis, tanto para a vida das pessoas, o desenvolvimento das famílias, a produtividade das empresas, como para os resultados econômicos macro do país. (KLIKSBERG, 2001, p. 112, grifo nosso)


          As características do atual processo de desenvolvimento tecnológico impõem novos desafios, com ênfase na questão dos recursos humanos, à medida em que a própria capacitação tecnológica implica na capacidade de gerar inovações de produtos e processos a partir do envolvimento dos próprios trabalhadores. Assim, a discussão acerca do papel da educação tecnológica recebe destaque nos debates atinentes ao mundo do trabalho, destacando-se a necessidade ofertar ao educando uma formação sólida, baseada em conteúdos gerais, que servirá de apoio aos vários níveis de qualificação, e também a uma formação profissional ampla, em todos os níveis, de modo a permitir ao trabalhador acompanhar as mudanças, cada vez mais frequentes, dos padrões tecnológicos (LAMPREIA, 1995)

          A intrínseca relação entre educação e desenvolvimento de uma região é foco de discussão de vários estudiosos. O reflexo do desenvolvimento local, como decorrência do aumento aos incentivos no setor educacional, podem ser observado na fala de Bruno (2011, p. 6), quando afirma que:


O que é importante destacar aqui é que apenas o acréscimo das qualificações decorrente de uma formação mais complexa do trabalhador permite a introdução de inovações e garante que se trabalhe eficazmente com elas, viabilizando os ganhos de produtividade. Sendo que, por outro lado, a falta de investimento na educação provocará inevitavelmente o atraso nas conquistas e avanços econômicos e sociais de uma dada região.

 

          Pelo exposto até aqui, percebe-se que o desenvolvimento territorial perpassa pela qualificação profissional. Assim, tanto a oferta de cursos disponíveis para a qualificação dos trabalhadores, quanto os investimento para a implantação e manutenção destes, dependem desenvolvimento verificado a nível regional. Essa oferta formativa deve ainda propiciar bases o desenvolvimento de indivíduos socialmente ativos, facultando aos mesmos a possibilidade de desenvolvimento humano e melhoria de sua condição econômica, o que influencia diretamente no desenvolvimento social.

           Essa linha de raciocínio parece-nos tão simples e clara, e um caminho tão seguro a ser percorrido para obtenção de melhores resultados no que se refere ao desenvolvimento local que faz emergir um novo questionamento: o que leva a identificarmos regiões que possuem baixas condições sociais e econômicas? Na busca de respostas para este questionamento Mattos (2013, p.22) revela que:


a gênese da educação profissional do Brasil esteve muito mais ligada a uma preocupação de preservar a ordem social, destinando alguma formação aos jovens das camadas mais pobres da população, que necessariamente atender a uma demanda de mão de obra


          Firmemente alicerçado nos conceitos de desenvolvimento econômico, humano e social, bem como no entendimento de que o meio em que as pessoas estão inseridas pode converter-se em um fato motivador para o desenvolvimento, compreendemos que se a região territorial for planejada com vistas a propiciar aos indivíduos condições de se desenvolverem, existe uma grande probabilidade de êxito neste processo de evolução. Emerge assim, como uma das estratégias fundamentais para o processo de desenvolvimento, a educação profissional e tecnológica, que deve, a partir desse contexto, avaliar o cenário econômico local para que ocorra a qualificação dos trabalhadores considerando as forças produtivas das regiões em que estão inseridos. Esse contexto nos remete ao problema de pesquisa desse trabalho, e permite-nos antecipar que o produto educacional será desenvolvido com o objetivo de estratificar as necessidades de oferta de educação profissional com base na demanda por trabalhadores qualificados a partir dos Arranjos Produtivos Locais eventualmente existentes no Município de Osório/RS.

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